Raffaella Bortolotto - A Gazeta da Casa, Ano IV, Junho de 2011
Barba e cabelos brancos, olhar agudo detrás dos óculos espessos, roupa folgada e sapatos curtidos, desses que vêm de longe. Assim José Carlos chega à Casa de América na tarde do 28 de abril, convidado pela organização Survival Internacional España. Ele veio para compartilhar conosco sua experiência de quase quarenta anos com os povos indígenas da Amazônia. No bate-papo, entre uma imagem e outra do seu documentário, José Carlos nos confesa que se considera um “trabalhador audiovisual”, fala na importância do testemunho gráfico, pois ele acha que hoje em dia sem foto não há notícia. Conta-nos que a sua primeira viagem foi em 1973, sendo o primeiro forâneo em se aproximar dos indígenas isolados, os que vivem sem contato com o exterior, os mais vulneráveis de toda a Amazônia. “Apresentaram-se três pessoas”, fala, “a comunicação era por mîmica. Depois, chegou um grupo de oitenta ou noventa homens. Nem posso negar ter tido receio, mas foi um medo que passou logo.”
Meirelles (São Paulo 1948), indigenista, deixou a ingenharia para trabalhar na FUNAI (Fundação Nacional do Índio). Ele é membro do Departamento de Índios Isolados do órgão desde a sua criação em 1988. Na sua atividade passou vários perigos, até levou uma flechada no rosto.
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Indígenas isolados, Survival International |
“Contudo”, afirma Meirelles, “apesar do marco legal há um abismo entre a lei e o cumprimento da mesma. Esses territórios já estão demarcados, sim, o problema é conseguir mantê-los assim, para além dos interesses econômicos dos fazenderos e dos lobbies da indústria petrolífera e da medeira. Os indígenas são seres que fazem parte da grande diversidade da raça humana. Não há direito a interferir na vida dessa gente, eles não têm de ser amansados, não precisam de compaixão, apenas de compreensão. Esses povos nem sabem que o Beethoven existiu, isso é verdade. Mas em muitos aspeitos eles são que amansam nós. Eles perderam nossa história. E nós, a deles.”
Meirelles e Luis Miguel Dominguez |
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