21 de julho de 2011

Viajar lendo

Da leitura e a viagem: um périplo pelas letras portuguesas
Raffaella Bortolotto - A Gazeta da Casa, Ano III, Junho de 2010


O que é a leitura se não uma viagem?   Ler é isso, viajar, é a gente se encontrar conosco no olhar do outro, para além do limite espaço-temporal. Folhear as páginas de um livro é uma aventura contínua que abre as portas da nossa mente, ajuda-nos a acharmos as respostas às nossas perguntas, leva-nos para outros países; é descoberta, é beleza, é fascínio.


E eu quis fazê-lo nas asas da língua portuguesa à procura das suas maravilhas, num diálogo sem voz direto com o meu narrador, sem intermediários.
Tenho viajado para dentro e no espaço exterior, ultrapassando as fronteiras geográficas por meio de um idioma que é pátria comum de autores de grande talento, às vezes desconhecidos pela maioria do público. Buscava tesouros e os encontrei.


Assim, no Rio de Janeiro de Machado de Assis assisti à missa do galo, brindei pelo ano novo com Rubem Fonseca, embaquei no navio de Cecília Meireles e marchei ao passo do coração andarilho de Nélida Piñón. Em Minas Gerais, Adélia Prado me ensinou qual é a coisa mais fina do mundo, marquei um encontro com Fernando Sabino, compartilhei minha paixão pela poesia, o pôr-do-sol e o canto dos ventos com Carlos Drummond de Andrade, e imaginei o céu do “grande sertão de João Guimarães Rosa. No Brasil, ainda, percorri o território gaúcho de Erico Veríssimo no cavalo do seu capitão Rodrigo e explorei a paisagem da infância de Milton Hatoum, descobrindo as cores da Amazônia, sua flora, seus sabores, seus cheiros. Além disso, sentei-me perto do coração selvagem de Clarice Lispector e fiquei fascinada pela sua prosa poética, pela sua genialidade, por aquela sua rara profundidade de olhar que sugere um universo de sensações. Também sonhei em casa com o baiano Jorge Amado, esse excelente contador de histórias que nos mostra um Brasil cheio de África. E mesmo desse continente imenso ouvi vozes que me levaram até a Angola de Ana Paula Ribeiro Tavares e Ondjaki, e o Moçambique de Mia Couto e Luis Bernardo Honwana. Aí conheci máscaras, tranças, sons e tambores, com um colar de missangas em volta do pescoço.

Sempre deste outro lado do Atlântico, cruzei metade da Europa montada no elefante Salomão de José Saramago, voei na chuva com a abelha de Carlos de Oliveira e me perdi à vontade entre as ruas da mágica Lisboa de Fernando Pessoa, aquele grande “fingidor”.

E isso tudo é só o início da aventura, pois ainda me falta percorrer muitas páginas em português, um caminho cuja finalidade com certeza não é um lugar de destino, mas a viagem em si.


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